Hoje, 10 de dezembro, é o Dia do Palhaço e da Palhaça, personagem que leva alegria e o riso por onde passa. Pois bem, considero injusto e preconceituoso quando dizem “fulano me fez de palhaço”, porque ser palhaço não é ser otário. Muito antes pelo contrário, é um ser de luz e de bobo não tem nada.
Mire-se no exemplo da palhaça mineira Guadalupe, (Tereza Gontijo), que começou sua trajetória na Escola na Spasso – Escola Popular de Circo, em Beagá, onde ficou dos 11 aos 18 anos. Estudou teatro no Palácio das Artes, na UFMG e graduou na UNESP, em São Paulo.
Atuou nos quadros da Associação Doutores da Alegria em 2010 em Belo Horizonte, onde continuou na mesma instituição ao se mudar pra São Paulo. Pra completar acabou de lançar o livro “Do riso ao soro”.
Ser palhaça é com humor cumprir uma função social, que dentre suas diversas possibilidades criativas, permite a expressão de aspectos humanos e sociais que tendem a ser escondidos, observa Teresa. “Através da palhaçaria posso expressar fragilidades humanas e comportamentos, que tendem a ser reprimidos em nome da moral e da ética, enfim, aspectos comuns a todos nós dos quais temos vergonha, sentimos culpa, queremos ocultar ou criticar. O palhaço é o espelho que revela os nossos avessos”.
Ela complementa dizendo que “ser palhaça também é agir por meio da leveza, da beleza, da gargalhada, buscando oferecer perspectivas mais bem-humoradas sobre nosso cotidiano. É vivenciar a vida pelo viés do Humor generoso, crítico, porém acolhedor.
A escolha da profissão se deu quando assistiu ao documentário Doutores da Alegria – o filme: “vi a arte acontecendo com um viés social e prático, modificando diretamente aquele momento na vida das pessoas. Ao ver atuação daqueles profissionais tive certeza de que era o que eu queria e precisava fazer. Juntei as técnicas que eu tinha (circo, teatro, improvisação e música) e comecei a atuar como palhaça. É como se eu sempre tivesse sido. Aquele começo só fez revelar essa vocação.
Na Associação Doutores da Alegria, há 16 anos, ela visita duas vezes por semana, as alas de pediatria em um mesmo hospital público. “Atuo junto com a mesma parceira e no mesmo local, o que me permite estabelecer uma relação constante e sólida com os pacientes, suas famílias e com a equipe multidisciplinar do hospital, criando um trabalho integrado”.
Essa vivência lhe deu bagagem para escrever o livro digital “Do riso ao soro”, sobre sua experiência nas alas pediátricas e como como influiu em seu modo de ver a vida. É também sobre transformações pessoais que se refletiram na sua profissão.
No livro, que vale a pena ler, ela aborda a fragilidade, vulnerabilidade, resiliência, mistério, maternidade, feminino e feminismo, racismo e o machismo estrutural, afeto, conexão.
Mais do que um trabalho, sua atuação nos hospitais, segundo ela, foi uma revelação pessoal, social, política, humana. Passou a viver com a constatação da impermanência – como uma lei da vida -, com a nossa vulnerabilidade e fragilidade, e que a vida não é certa e não oferece garantias, embora a gente tenda a ignorar isso.
“Constatei que o mistério faz parte da vida, há muito que não se explica, que não se domina. O ser humano é capaz de grandes realizações no que diz respeito à resiliência, fé, afeto, cuidado, fraternidade e que também é capaz de realizar atrocidades, violências, abandonos… tomo contato com isso todos os dias. Somos seres complexos, paradoxais, fascinantes, detestáveis. Essa pluralidade me encanta”, observa Guadalupe, ou melhor, a Teresa Gontijo.